Cangaceiro esperança.
A fazenda Quirino,
no povoado São Francisco, Macururé, Bahia, era um dos coitos do bando de Lampião e
principalmente reduto dos cangaceiros nascidos entre Macururé, Brejo do Burgo,
Santo Antonio da Glória e Chorrochó.
Entre eles Gavião, Azulão, Esperança, Cocada, Zé Sereno, Zé Baiano e Gato. No povoado São Francisco a mãe de Esperança,
dona Andressa, tinha terras por lá, porém ela residia na Várzea da Ema. O
comandante de volante que destacava na Várzea da Ema era Antonio Justiniano e
dois dos soldados que ele comandava eram irmãos de Esperança: Vicente,
apelidado de Medalha e Ananias.
A fazenda Quirino pertencia
a Ludugero, tio do cangaceiro Esperança.
Esperança, Cocada, Pancada
e Gavião, encontravam-se acoitados próximo ao sítio Quirino. Dentro de um
cercado os cangaceiros catavam imbu quando chegou o dono do terreno e Cocada o
prendeu e depois o soltou. O sertanejo correu e foi avisar policia do encontro
que teve com os cangaceiros.
Dona Andressa
sempre que precisava ir ver suas criações no São Francisco tinha que pedir autorização
ao comandante do destacamento e foi em uma dessas viagens que ela travou
diálogo com o contratado Reginaldo que lhe sugeriu pedir para que Esperança se
entregasse que nada lhe aconteceria, de preferência que ele trouxesse a cabeça
de um companheiro que sua vida tava garantida. Andressa levou o recado ao filho
que mesmo relutante acabou cedendo aos apelos da querida mãe. Reginaldo mandou
roupas novas de mescla azul para Esperança. O cangaceiro ainda relutante disse
a mãe que não tinha coragem de se entregar e a mãe saiu triste.
Era março de 1933,
no coito encontrava-se Esperança, Cocada, Gavião e Pancada. Esperança chamou Cocada para irem pegar água
em um caldeirão ali próximo. Os dois seguiram na direção do caldeirão. Diante
quando chegaram ao caldeirão sentaram-se e ficaram conversando. Cocada limpou
sua arma e depois pediu a arma do amigo para ele limpar e Cocada entregou seu
mosquetão. Esperança limpou, colocou uma bala na agulha e detonou. O cangaceiro
com o impacto do tiro caiu uns dois metros de distância e sem saber de onde
tinha partido o disparo pediu socorro:
- Me acode Esperança, não deixe os “MACACOS” me matar!
Esperança pegou o
facão da marca jacaré, partiu na direção do moribundo e o degolou ainda com
vida. Pegou os bornais, armas, a cabeça do cangaceiro e foi se entregar a
policia. Na Várzea da Ema ele se entregou
as autoridades, contou detalhes da morte que fez, denunciou os coitos
dos cangaceiros na região. Com dez dias
depois foi encaminhado para a
cidade de Uauá, onde o capitão Manoel Campos de Menezes que o livrou da prisão
e o incorporou na volante policial do tenente Santinho como contratado . Ficou
sendo o corneteiro do grupo. Trabalhou em Jeremoabo e faleceu tempos depois na
cidade de Juazeiro, Bahia.
AINDA NA PRISÃO EM
VÁRZEA DA EMA.
O cangaceiro
Esperança quando preso, já atendendo agora por Mamede, seu nome real, encontrou
o com o jovem sobrinho José Gonçalves
Varjão, apelidado de Pororô e lhe confidenciou que na frondosa árvore lateral a
casa de sua família, enterrado próximo ao seu tronco, tinha um material
guardado e que ele tirasse e entregasse a seu pai. Pororô procurou ao redor da
árvore mais diante da pouca idade não encontrou forças para continuar a
empreitada de escavação no duro chão de cascalhos. O tempo passou, Pororô
cresceu e retornando certo dia de uma caçada, quando se aproximava de sua velha
residência, viu quando seu cachorro passou acuando um preá, o cachorro parou
próximo a antiga e frondosa árvore, Pororô se aproximou e viu o cão rosnando e
olhando para um pé de macambira, Pororô tirou a cactácea e avistou uma lajota
cobrindo um buraco, tirou a pedra, o preá correu com o cachorro latindo atrás,
Pororô puxou um tecido em farrapos que cobriam algumas peças, entre elas: Uma
colher de prata, 160 cartuchos de fuzil, um punhal, uma espora e algumas
moedas. Era esse o tesouro de Esperança que ele havia pedido para o sobrinho guardar.
Pororô vendeu os cartuchos a um dos prefeitos de Macururé. A colher de prata,
algumas moedas, o punhal e uma das esporas ele me presenteou. Na colher encontramos
as letras: MA. Talvez o cangaceiro tenha tentado escrever seu verdadeiro nome:
MAMEDE. No punhal tem um “NA” ou “NH”.
Pororô ainda reside e
seu irmão Izidoro ainda residem no São Francisco e os Quirino é herança que
ficou com a família. Aquele longínquo pedaço de chão ainda guarda as histórias
do cangaço vivido em suas terras, memórias ainda latentes de um tempo que teima
em não ser esquecido e nem deve....
SEGUE EM ANEXO A
ESSE TEXTO UMA DAS CARTAS DE INTERROGATÓRIOS REALIZADOS PELA POLÍCIA E QUE
MOSTRA A IMPORTÂNCIA DESSES LUGARES CITADOS COM A HISTÓRIA DO CANGAÇO E A
REFERÊNCIA COM PESSOAS DA LOCALIDADE. A CARTA VAI TRANSCRITA NA INTEGRA COM OS
ERROS E INCORREÇÕES:
“Aos três do mês de
maio de 1932, no arraial de Várzea da Ema em casa de residência do segundo
tenente Antonio Justiniano de Souza, sub delegado de policia, foi interrogado o
bandido acima referido que disse:
“Em 1929, estando
ele bandido, em seu rancho no lugar denominado São Francisco, foi surpreendido
pelo grupo de Lampião que ali chegava a mando do Cel. Petronílio de Alcântara
Reis, para que fosse as imediações do Icó e ali receber dinheiro enviado para
Lampião, cuja importância era 20:000$000, mas só foram entregues 18:000$000 e
que dois restantes Lampião disse que dava por recebido, quando lhe mandasse um
cunheito de munição; o que não sabe-se se isso efetuou-se, mais depois ouviu do bandido ferrugem a
declaração de que teve referido Cel. Petronilio havia comprado munição. E que
devido a esse encontrão foi ele depoente obrigado a refugiar-se nas Caatingas,
pois as forças andavam a sua procura tendo por isso de quando em vez constantes
encontros com os cangaceiros, merecendo do mesmo consideração a ponto de lhe
ser entregue por “Lampião” um rifle com cem cartuchos, os quais conservou até a
data de sua prisão, não tendo, porém feito uso da dita arma para a prática de
crime.
Que sempre foi
seduzido por “Lampião” para fazer parte
do seu grupo, mas nunca aceitou, apesar de ter parente no grupo, como sejam:
Azulão, Carrasco e Moita Brava. Que esses encontros se efetuavam no lugar
denominado Quirino para Lagoa Grande, sendo os sinais convencionados para os
referidos encontros, três pancadas em um
pau seco, ou então berrando como boi; que nunca recebeu dinheiro de “Lampião” a
não ser algumas roupas dadas pelos cãibras.
Que nos últimos
encontros que “Lampião” teve com as tropas. Ele respondendo notou que alguns
companheiros estavam desgostosos por verem os sacrifícios da causa, que nessa
data viajaram nos “cascalhos” das aroeiras com direção a Várzea pernoitando a
três quilômetros de distância.
Que nessa mesma
noite desligou-se do bando a meia noite com Manoel Sinhô de Aquileu, sem que
fossem pressentidos pelos outros e vieram pairar nas “Canouas” onde foram informados
por Pedro de Aquileu que havia garantia para todos aqueles que tinham ligações
com cangaceiros, uma vez que procurassem as autoridades para se entregarem.
E baseado nisso em
companhia de Pedro veio à procura do Tenente Justiniano em Várzea de Ema onde
se acha. Disse mais que “Lampião” depois do combate do touro com o Tenente
Arsênio cuja força foi imboscada e morreu quase toda, escapando o referido
oficial, pois é um herói que infrentou o grupo que era numeroso, com um fuzil
metralhadora dando somente três rajadas conseguiu matar o irmão de Lampião,
Ponto Fino e sendo forçado a abandonar a arma deixando-a inutilizada pelos
bandidos.
Que nessa ocasião
encontrou Lampião cartas ao Cel. Petronilio acusando Lampião, por isso Lampião
resouveu queimar algumas fazendas referido Cel. Petronilio.
Disse mais que
ouviu de Lampião dizer que tinha mil tiros de fuzil enterrados em um ponto lá
para baixo, não declarado ao certo o lugar e que ia também a Curaçá a procura
de outros mil tiros que tinha para lá.
Quanto ao
armazenamento sabe que Lampião tem alguns
rifles ensebados em ocos de pau (ensebados, para não darem o bicho
próprio de madeira).
Perguntado quais
são as pessoas que fornecem armas a Lampião respondeu que não conhece mais sabe
que nas fazendas Juá, Várzea, e São José há “coitos” onde lhes prestam bastante
serviços em abastecimentos.
E por nada mais
dizer nem lhe ser perguntado deus-se por findo estas declarações ao presente
auto que vae por todos assignados pelo tenente e testemunhas.
Várzea da Ema, 7 de maio de 1932”
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Paulo Afonso, Bahia, 16 de
fevereiro de 2013
João de Sousa Lima,
Historiador e escritor, Membro da
ALPA- Academia de Letras de Paulo Afonso.
Membro do IGH- Instituto
Geográfico e Histórico de Paulo Afonso
Membro do Grupo de Estudos do
Cangaço do Ceará- Fortaleza- CE.Izidoro, João Lima e José Pororô. Sobrinhos de Esperança abraçando o escritor João de Sousa Lima.
João e Jovelina Barbosa, irmã do cangaceiro Azulão, povoado São Francisco.
Sargento Otávio Farias, radiotelegrafista da policia baiana, serviu na Várzea da Ema, enviava sempre as mensagens contando os combates dos cangaceiros contra as volantes.
cabeça do Cangaceiro Cocada,morto por Esperança.
Punhal de Esperança.
Colher de prata de Esperança presenteada ao escritor João de Sousa Lima pelo sobrinho do cangaceiro.
detalhe do cabo do punhal de Esperança.
Iniciais MA escrito no cabo da colher de prata. A prata foi muito usada pelos cangaceiros para testarem bebidas e comidas se estavam envenenados.
detalhes do punhal e da colher de prata.
Ludugero, tio de Esperança, dono da fazenda Quirino.
PARABÉNS AMIGO JOÃO, POR MAIS ESSA IMPORTANTE MATÉRIA...
ResponderExcluirVOCÊ É UM INCANSÁVEL BATALHADOR A DESVENDAR E PARTILHAR COM TODOS OS ESTUDIOSOS, A SUAS DESCOBERTAS CANGACEIRÍSTICAS...
UMA DAS QUALIDADES QUE MAIS ADMIRAMOS EM VOCÊ, É A SUA HUMILDADE, E A DEMOCRATIZAÇÃO DAS INFORMAÇÕES COLETADAS.....VALEU AMIGÃO...!!!
ABRAÇO
IVANILDO ALVES SILVEIRA
Colecionador do cangaço
NATAL/RN
Meus sinceros parabéns amigo. Pelo seu árduo trabalho de pesquisas. Sou escritor maranhense e também escrevo cordel.
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