segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

A CIDADE DE PIRANHAS E A AVENTURA DO RESGATE DO COFRE. - www.joaodesousalima.blogspot.com


    

A CIDADE DE PIRANHAS E A AVENTURA DO RESGATE DO COFRE.

     A cidade de Piranhas é uma das mais belas cidades alagoana. A cidade respira história, desde as grandes embarcações que vinham trazendo objetos e materiais do litoral para ser distribuídos na região pelas locomotivas da Great West, através da Estrada de Ferro Paulo Afonso, que subia e descia serras até a cidade de Jatobá de Petrolândia, passando pela visita de D. Pedro II, quando em 1859 visitou a Cachoeira de Paulo Afonso, sendo também de grande importância na história do cangaço.
    Sem sombras de dúvidas, Piranhas é uma das mais belas e admiráveis cidades de Alagoas.
     Dia 10 de janeiro de 2017, eu convidei o amigo Ivan Caetano, octogenário e ex-mecânico de avião da CHESF (um dos mais inteligentes homens que conheci na vida, inteligência beirando a genialidade). Tive a oportunidade de trabalhar oito anos com Ivan quando fui abastecedor de aeronaves, trabalhando na Paulo Afonso Combustíveis.
 Convidei Ivan Caetano tanto por sua amizade quanto por ter o suporte de sua caminhonete Ford, F 1000, ano 1980, a “Velha Trubana”.
      Ivan e sua esposa Lenilda seguiram na antiga Trubana e eu fui acompanhando no meu carro na presença do amigo Nilton “Negrito”.
     O intuito de nossa ida até Piranhas, além de saborear o delicioso peixe nas margens do rio São Francisco foi pegar um presente que ganhei de um amigo político da cidade: Um Cofre que pertencia a Rede Ferroviária Great West.
    Quando do fim da Estrada de Ferro de Paulo Afonso o cofre ficou sob os cuidados de Valdemar Damasceno (Valdemar Damasceno era telegrafista e foi quem passou o telegrama de Piranhas para a cidade de Delmiro avisando da presença de Lampião nas proximidades: “TEM BOI NO PASTO”).
     O cofre passou muito tempo guardado e estava em um local de difícil acesso para locomoção, sem contar no peso incrível que possui.
     Chegamos até piranhas já depois do meio dia, barriga avisando que já passava da hora do almoço e nossa parada primeira foi no restaurante de Carlinhos, onde degustamos uma moqueca de surubim e uma tilápia frita.
      No restaurante encontramos “Nito”, um velho amigo de travessias do São Francisco. Nito é simplesmente um dos mais experientes barqueiros daquelas águas, conhecedor dos trajetos entre as corredeiras e as pedras.
Falei a Nito o motivo de nossa presença ali e ele sempre solícito saiu às pressas e retornou alguns minutos depois com cinco caibros e uma corda. Diante de nossos olhares colocou o material na caminhonete e falou:
- Estou pronto, vamos lá!
Dirigimo-nos a pousada Maria Bonita, onde Manuel “Bode”, gerente da pousada, nos aguardava e onde se encontrava o cofre.
Eu, Ivan, Lenilda, Negrito e Nito vencemos uma íngreme subida com inúmeros degraus. Na pousada Manuel e seu irmão Lielson já nos aguardavam.
Começou ai uma grande aventura. Com muito trabalho deslocamos o cofre de cima de um batente que fica encostado em um paredão natural de pedra do ultimo apartamento da pousada. O cofre pesadíssimo foi amarrado nos caibros por Nito e Ivan Caetano.
Ivan nos impressionou pela agilidade, mesmo já tendo passado dos oitenta janeiros.
Com dois caibros do lado direito e mais dois do lado esquerdo, eu, Manuel, Lielson, Ivan, Negrito, Nito, tendo o apoio fotográfico de Washington, colocamos os caibros nos ombros e descemos alguns batentes, caminho apertado. Em uma das passagens foi tão difícil transpor que Ivan brincou:
- Com mais uma mão de tinta não daria pra passar!
     As escadarias cheias de curvas apertadas, o peso nas costas, os caibros se juntando e imprensando nossas mãos, paradas de minuto em minuto, discussões para trocarmos idéias, cada uma mais mirabolantes que outras. Uma das ideias mais loucas foi colocada por Negrito que queria jogar o cofre de serra abaixo e esperarmos ele embaixo. Conversando, ouvindo Ideias, fomos vencendo a escadaria na força bruta mesmo, degrau a degrau, minuto a minuto, parada a parada.
Lenilda seguindo o cortejo e sempre lembrando Ivan:
- Olha o esforço, olha a idade, cuidado com a pressão, você já não é um menino!
    Por incrível que pareça, era Ivan o mais ágil entre todos. Abaixava-se, ajustava o cofre, apertava os nós, punha os caibros nos ombros e dava a ordem:
- Vamos lá, estamos chegando!
    Corpos suados, cansados, algumas partes arranhadas, uns mais cansados que outros. Vencemos a última ladeira e foi uma alegria imensa quando avistamos um pouco abaixo a “Trubana”.
Abrimos a tampa da carroceria e vencemos o ultimo obstáculo. O cofre estava seguro. Um contentamento invadiu os corpos cansados. Refizemo-nos e descemos cruzando o centro histórico e indo hidratar os corpos suados e cansados.
Entre a água de coco, refrigerantes e cervejas cada um dava sua versão da aventura, zombavam da mão presa do amigo nos caibros e cordas, das pernas cambaleantes diante do peso, da engenharia sem sucesso de alguns. A etapa estava vencida. Lutaram todos. Venceram todos.
Despedimo-nos dos amigos e seguimos viagem, aventura longe de ter acabado. Ivan ia liderando o pequeno comboio. Em uma das curvas na subida várias motos paradas. Do lado esquerdo uma moça no chão com uma criança nos braços, todas ensanguentadas. Parei o carro e corremos, eu e Negrito,  para socorrer as vítimas. Um mototaxista estava ficando em pé com dificuldades mais já amparado por um companheiro. Coloquei a criança que chorava copiosamente nos braços e a acomodei no banco traseiro do veículo, retornei, levantei a moça, tirei a camisa e enrolei em sua mão esquerda que sangrava muito, enlacei seu braço em meu pescoço, abracei em sua cintura e a assentei ao lado da criança. Ivan que me aguardava um pouco acima, pedi que fosse adiantando a viagem e me esperasse no museu de Delmiro Gouveia e segui para o hospital da vila Xingó. No trajeto fiquei sabendo o nome da criança: Anne.
Diante de suas lágrimas eu tentava a todo custo acalmá-la. Ela falava que tinha medo de sangue, que não queria ver sangue, pedia para que não deixasse aplicar injeção nela e eu prometi (mesmo sem saber se poderia cumprir minha promessa) que não deixaria aplicar nenhuma injeção, mais ela teria que parar de chorar. Fiquei sabendo que a moça era irmã de Anne e que seu nome era Raíssa. Chegamos ao hospital, coloquei Anne nos braços e entrei sendo logo atendido por várias enfermeiras. Raíssa foi colocada em uma cadeira de rodas pela dificuldade que tinha em se locomover em decorrência de uma forte pancada no joelho direito.
Anne chorava, mesmo eu dizendo que Tio João só a largaria quando ela estivesse boa. As enfermeiras pediram que eu entrasse com Anne em uma das salas. A enfermeira pegou gazes e uns líquidos e começou a limpar o sangue que tomava conta do corpo da criança. Uma grata surpresa quando ficamos sabendo que o sangue não era de Ane e sim o sangue de Raíssa que havia ensopado sua irmã enquanto ela a agarrava e a protegia com seu próprio corpo.
Anne abriu momentaneamente um sorriso quando soube que não tomaria injeção. Até riu sentindo cócegas enquanto a enfermeira limpava sua barriga com um liquido, segundo ela, friozinho.
A preocupação passou a ser Raíssa que empurrada por Negrito seguiu na cadeira de rodas para o Raio X.
O médico veio ver Anne e pediu que ela fizesse uns movimentos na mão direita, mão que ela alegava estar doendo. Não foi diagnosticado nada em Anne e mais uma vez ela sorriu.
Ficamos sentados no corredor do hospital e Anne sempre perguntado por Raíssa e eu tentando confortá-la, dizendo que Raíssa estava bem e que estava vindo para irmos para casa.
No fim do corredor apareceu Negrito empurrando Raíssa com umas “CHAPAS” em uma das mãos. O médico olhou os exames e pra felicidades de todos, Raíssa só sofrera escoriações no joelho e nos dedos da mão esquerda.
Levei Anne até o carro e Negrito trouxe Raíssa. As acomodamos e fomos deixá-las na casa dos avós, na vila Xingó, por trás do pátio da feira livre.
Agradecimentos e despedidas e seguimos viagem. Já na estrada o sistema nervoso me cobrou o preço da ação e me emocionei lembrando Anne. Veio na mente a lembrança de minhas duas filhas. Depois lembrei o sorriso de Anne e essa lembrança me confortou. Um silêncio profundo dentro do carro e fomos avistando Ivan e Lenilda, encostados na carroceria de Trubana. Contamos sobre todo o ocorrido e já com a noite chegando seguimos nossa viagem.
    Às dezenove horas chegamos a Paulo Afonso, me despedi de Ivan, Lenilda e Negrito e fui pra casa. No aconchego do lar, relembrando a agitada aventura, recordei das lágrimas de Anne, mais também do seu doce sorriso. Pedi a deus que a protegesse sempre.
Rememorei o cofre, o peso nele contido, a história por trás da aventura, a descida difícil, o trajeto vencido, o suor nos rostos, as falas, da saúde, agilidade e lucidez do meu querido Ivan Caetano. Dentre tudo vivido, nada me marcou mais que o sorriso da Anne e a vitalidade de Ivan e quando chegar ao fim da vida, se velhinho eu for pela graça de Deus, poderei contar aos netos, que em um dia passado, eu vivi uma grande aventura, a aventura do cofre, nas terras da bela Piranhas e que nesse dia a inocência de Ane e a idade de mais de oitenta anos do amigo Ivan, refletidos na vasta cabeleira prateada, feito reluzente raio luar refletido na água doce do Velho Chico, me proporcionaram, no trajeto da vida, uma inesquecível e doce aventura.

João de Sousa Lima
Historiador e Escritor
Paulo Afonso, 16 de janeiro de 2017
















3 comentários:

  1. É muito gratificante fazer o bem,por esse motivo eu escolhi ser enfermeira,essa relação de acolhimento para com o outro só quem realmente tem humanismo na alma...
    Att:
    Enf: ALINE MELO

    ResponderExcluir
  2. É muito gratificante fazer o bem,por esse motivo eu escolhi ser enfermeira,essa relação de acolhimento para com o outro só quem realmente tem humanismo na alma...
    Att:
    Enf: ALINE MELO

    ResponderExcluir
  3. Olá João, gostaria de comprar o seu livro sobre a usina de Paulo Afonso e da Usina de Angiquinho, mande-me um email: andrearoeirap@gmail.com

    ResponderExcluir