quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

João de Sousa Lima, pesquisador do tema cangaço, descobre mais uma história interessante de Lampião

27/11/2008 - 11:47

Escritor descobre em Chorrochó-Ba mais um filho de Lampião

Em suas pesquisas, o escritor João de Sousa Lima encontrou, "José Alves dos Santos ainda encontra-se vivo e residindo em Chorrochó, nas mesmas terras onde seus pais o criaram".

Antônio Galdino - texto de João de Souza Lima

João Lima entre o ex-soldado Teófilo (à sua direita) e Zé Alves.

Pesquisador respeitado junto aos estudiosos do cangaço, o escritor João de Sousa Lima, autor dos livros A Trajetória Guerreira de Maria Bonita, a Rainha do Cangaço, Moreno & Durvinha - Sangue, amor e fuga no cangaço e Lampião em Paulo Afonso nos quais relata depoimentos de mais de quarenta pessoas que conviveram com Lampião, como cangaceiros, coiteiros e até ex-soldados das "volantes" da época, consegue agora mais uma feito histórico que certamente vai enriquecer a história do rei do cangaço.
Diferente de alguns autores que têm escrito verdadeiras fantasias sobre Lampião, João Lima procura ir às fontes mais seguras, beber das informações guardadas a sete chaves por décadas. É o que tem feito sempre ao produzir seus escritos. Esse cuidado tem lhe valido o reconhecimento de outros importantes pesquisadores e o convite constante para participar de congressos, simpósios e reuniões de estudos sobre o tema, em todo o Brasil.
Chegou recentemente de Belo Horizonte e vai no início de dezembro para Serrinha, na Bahia apresentar seu mais recente trabalho "Moreno & Durvinha – Sangue, amor e fuga no cangaço"
Os seus livros são fartamente ilustradas por fotografias e documentos de época que lhe dão ainda mais autenticidade e credibilidade.
O farto material que tem sido recolhido, peças raríssimas, fotografias, filmes e documentos, por João será disponibilizado em breve para o Museu da Cultura Regional de Paulo Afonso e será mais uma rica fonte de consulta e pesquisa para aqueles que desejarem conhecer mais ainda sobre esse período, o ciclo do cangaço, da caatinga nordestina.
João Sousa Lima é escritor e pesquisador, membro da SBEC - Sociedade de Estudos do Cangaço e membro da Academia de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Paulo Afonso. Dentre os seus projetos futuros, além da organização deste museu, está a produção de filmes sobre o tema, em parceria com a Folha Sertaneja e outros parceiros da região.

A seguir, o relato, publicado com exclusividade pela Folha Sertaneja em suas edições on-line e impressa (Edição nº 57, de 30 de novembro de 2008).
Antônio Galdino – Diretor da Folha Sertaneja
OS FILHOS DO REI DO CANGAÇO
Por João de Souza Lima

A semelhança com Lampião está até no olho vazado

Enigmático é o mundo do cangaço, ainda mais pela forma e o tempo de seus participantes resguardarem seus acontecimentos. Os últimos remanescentes, só agora, quando beirando os cem anos de idade, estão revelando seus segredos. Por longos anos, os fatos vivenciados foram trancados nos baús do esquecimento e lacrados com a chave da fidelidade da palavra empenhada.
O tempo cuidou de reparar as falhas do passado e se fazer sentir a urgência de registrar seus marcantes episódios. Grande prejuízo para a história recente do nosso país, seria a perca dos relatos desses homens e dessas mulheres que viveram nas Caatingas, as conseqüências de uma luta ainda tão marcante para nosso povo do Sertão Nordestino.
Misteriosa obediência ao segredo carrega o sertanejo, como se fosse parte inseparável o segredo e a honra.
Alicerço-me no depoimento de Firmina Maria da Conceição, "Dona Cabocla", cozinheira e lavadeira do bando de Lampião, que prestes a completar 102 anos de idade, no próximo mês de maio, lamentou ter me contado sua vivência com o Rei do Cangaço, se arrependendo de ter relatado sua relação dos préstimos de serviços ao cangaceiro, achando que mesmo hoje, o segredo deveria ter ficado guardado, só o confidenciando por insistência da filha Maria.
Por tamanha devoção e fidelidade cresceu minha admiração e respeito a essa mulher que é hoje parte da nossa história recente. É este um dos mais sinceros e puros exemplos de lealdade.
Por ser Lampião a figura central do cangaço, sendo o maior expoente desse capítulo da história, o estudo referente ao tema tem recaído sua maior parte sob seus rastros. Diante do mínimo vestígio de fundamento, nós nos defrontamos com a questão inevitável de transmiti-la.
Os caminhos trilhados buscam os fatos inéditos, seguindo uma infindável legião de admiradores e estudiosos ávidos a alcançarem os novos achados. Em busca deles tenho me dedicado a longos dez anos de uma extensa pesquisa.

José Alves, filho de Lampião

Nessa caminhada na busca de informações sobre a história de Lampião, neste longo trajeto, um dos fatos mais marcantes foi a descoberta de um filho de Lampião e Maria Bonita.
Das quatro gestações da cangaceira, sabíamos apenas sobre Expedita Ferreira da Silva, ainda viva e residindo em Aracaju.
Quando comecei a escrever o livro: "A Trajetória Guerreira de Maria Bonita, A Rainha do Cangaço", sempre que perguntava aos meus entrevistados detalhes sobre os gêmeos Arlindo e Ananias, irmãos de Maria Bonita, ou obtinha o silêncio por resposta ou escutava um curto e desafiador resmungar: "Ananias não é irmão de Maria Bonita não!".
Tive que me desdobrar para conseguir alguém que me explicasse mais abertamente essa afirmativa. Durante dias busquei os informes dos familiares e amigos que conviveram com Maria Bonita nos conturbados dias do cangaço.
Um dos primos de Maria, um senhor chamado Manuel Maria dos Santos, apelidado por "Seu Nequinho", um ex-barqueiro acostumado atravessar, junto com o pai, os cangaceiros que cruzavam o milenar Rio São Francisco, foi o primeiro a confidenciar: "Ananias é filho de Lampião e Maria Bonita! Aqui todo mundo sempre soube desse segredo. Agora, na época de Lampião, quem era doido de andar com uma conversa dessa?!"
Seu Nequinho ainda indicou mais algumas fontes que poderiam atestar o que ele estava dizendo e fui buscar a comprovação. Dentre as pessoas que fizeram seus relatos (e os tenho todos filmados para futuras comprovações) pode-se encontrar Servina Oliveira de Sá (prima de Maria Bonita), Eribaldo Ferreira Oliveira (sobrinho de Maria Bonita), os irmãos Osvaldo, Olindina e Maria Martins de Sá (primos de Maria Bonita), Firmino Martins de Sá (foi casado com a prima e melhor amiga de Maria Bonita: Maria Rodrigues de Sá). Estes são alguns dos que confirmaram a história que se segue:
Dona Maria Joaquina Conceição Oliveira, "Dona Déa", mãe da Rainha do Cangaço, estava grávida e por coincidência Maria Bonita havia engravidado quase que na mesma época. Por questão de aproximadamente dois dias, as duas mulheres viram nascerem seus rebentos. Mãe e filha gerando vidas e fazendo crescer sua descendência.

Pelas dificuldades impostas pela luta travada nas caatingas, onde cangaceiro vivia permanentemente em fuga, lutando contra as perseguições da polícia, filho era um entrave, levando perigo aos componentes do grupo e sofrendo as conseqüências da vida atribulada. Os filhos nascidos no cangaço, sempre iam cair nos braços de alguma autoridade política ou religiosa e às vezes enviados aos simples catingueiros, quando dotados da extrema confiança do cangaceiro. Duro castigo para as mães que tinham que ver seus filhos serem criados por outras pessoas.
Maria Bonita dera à luz. Lampião arquitetou deixar o filho com a sogra, para que ela criasse as crianças como se fossem gêmeas e assim aconteceu. O filho de Dona Déa ganhou o nome de Arlindo Gomes de Oliveira e o filho de Lampião e Maria Bonita foi batizado como Ananias Gomes Oliveira. Ananias ainda esta vivo, residindo em São Paulo. Arlindo faleceu recentemente. Era fácil observar as diferenças entre os irmãos: Arlindo era baixo e claro, Ananias é alto e moreno, ganhando por sua cor escura, o apelido de "Pretão".
Dos depoimentos que se tem registro daquela época, o mais contundente é o deixado por José Mutti, major reformado do exército, que foi casado com Antonia Oliveira (irmã de Maria Bonita) e que escreveu o livro: Reminiscências de um ex-comandante de volante, que retrata com detalhes sobre a descoberta desse segredo, vejam a parte do capitulo que trata do mistério:
"... ao chegar nos Picos do Tará, encontrei meus sogros arranchados numa frondosa quixabeira. Mandei construir dois quartos pra eles. encontrei duas crianças de dois anos cada. Tendo perguntado de quem eram filhos, dona Déa disse-me que eram mabaços (gêmeos) e eram seus filhos. As crianças eram completamente diferentes. O Arlindo sim, era parecido com a família, mais o Ananias era trigueiro (moreno escuro), não podia ser do mesmo casal José Filipe e Déa.
Deu-me o estalo de "Vieira" será o Ananias, filho de Lampião e Maria?. Comecei a perseguir a sogra:"Dona Déa, diga-me quem é o pai de Ananias, o Ananias não é filho da senhora e do José Filipe. Se a senhora disser de quem é filho o pretão (apelido do Ananias) eu guardo segredo até a morte. "Tanto persegui minha sogra para saber quem era o pai de Pretão, que um dia ela me disse "O Pretão é filho do homem" (a família de Maria Bonita tratava Lampião de "O HOMEM"), fiquei satisfeito e não falei mais no assunto".


Ai está desvendado mais um dos mistérios do cangaço e para registro histórico, vale salientar que Ananias concordou fazer o exame de DNA, sendo coletado sangue de dona Mocinha (irmã de lampião), de Arlindo (o irmão que se diz gêmeo) e do irmão Ozéas Gomes. O desfecho está sendo aguardado porque vem sendo movido por meios judiciais uma vez que Expedita e Vera Ferreira (filha e neta de Lampião e Maria Bonita) se negaram a fazer os exames.
Outro caso que foi bastante difundido foi o de João Peitudo, outro suposto filho dos Reis do Cangaço, mais um que tentou em vão se aproximar da família e não obteve resultados.
Continuando no campo da pesquisa histórica, vasculhando as fontes que trazem alguma ligação com o cangaço, acabo de descobrir outro filho de Lampião, na cidade de Chorrochó, Bahia.
Ele é da família dos famosos "Engrácias", as primeiras pessoas que mantiveram contato com Lampião quando ele entrou no estado da Bahia, tendo vários membros dessa família seguido os cangaceiros. Alguns se tornaram famosos, como: Cirilo de Engrácia, Antônio de Engrácia, Zé Sereno, Zé Baiano, Arvoredo e Corisco.

Da família dos "Engrácias" um dos grandes coiteiros de Lampião nessa região foi João Ramos de Souza, conhecido por todos como Joãozinho. Entre as filhas desse coiteiro Lampião se engraçou da jovem Helena e com ela teve um caso, poucos dias depois a menina-moça apareceu grávida e O Rei do Cangaço para resguardar a honra da jovem e não desmoralizar a família que tanto lhe dava guarida tomou uma rápida e sábia decisão:
Pagou uma alta quantia a um rapaz, Simão Alves dos Santos, para que ele casasse com Helena e assumisse a paternidade do filho do cangaceiro. Simão topou o acordo e assim foi feito, nascendo a criança no dia 13 de agosto de 1930, sendo batizada com o nome de José Alves dos Santos. O parto foi realizado por dona Lídia, mãe do cangaceiro Zé Sereno. Durante muito tempo as conversas sobre esse caso foram mantidas em segredo, temendo a população que Lampião fosse sabedor que a conversa havia se espalhado.


Quando Lampião morreu e o cangaço se extinguiu as brincadeiras começaram a surgir e os amigos de José Alves sempre o perturbavam relacionando-o como filho de Lampião. Os comentários tornaram-se freqüentes e as pessoas de mais idade sempre tocavam no assunto.

José Alves dos Santos ainda encontra-se vivo e residindo em Chorrochó, nas mesmas terras onde seus pais o criaram. Estive recentemente com ele quando realizei extensa entrevista e ele concordou em fazer um exame de DNA para realmente comprovar o que os fatos indicam.

Os testes estão em andamento e só o tempo dirá se ele é realmente mais um filho gerado nas caatingas do Sertão Nordestino, mais um rebento descendente de Lampião, mais um fruto evidenciado de um farto capítulo da nossa história recente, a história do Cangaço, capítulo ainda tão latente, tão presente nos carrascais do Sertão.

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Livros de João de Souza Lima:


Além de palestras e textos para jornais e revistas como o que relata os 70 anos da morte de Lampião, publicado no jornal Folha Sertaneja, edição 53, de julho de 2008 e no Folha Sertaneja On line do dia 9 de agosto de 2008, João Sousa Lima, que visitou e entrevistou dezenas de pessoas muito próximas de Lampião e descendentes dessas pessoas, escreveu os livros "Lampião em Paulo Afonso" em 2003, pela Graf Tech, Paulo Afonso-BA 194 pág. (esgotado), nova edição prevista para julho de 2009; " A trajetória guerreira de Maria Bonita, a Rainha do Cangaço", 2005, Ed. Fonte Viva, Paulo Afonso-BA, 112 pag. e "Morena e Durvinha - Sangue, amor e fuga no cangaço" 2007, Ed. Fonte Viva, Paulo Afonso - BA., 190 pag.

2 comentários:

  1. Amigo Antonio Galdino: Parabens pelo excelente texto. José Mendes Pereira - Mossoró - Rio Grande do Norte

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  2. Amigo João de Sousa Lima:

    O exame de DNA do seu José Alves dos Santos para saber se é mesmo filho de Lampião, foi realizado, e qual foi o resultado, positivo ou negativo?

    Agradeço a sua informação.

    José Mendes Pereira - Mossoró-RN.

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