sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Maria Bonita, a Cangaceira e um breve resumo de sua vida no bando de Lampião

Paulo Afonso e as belas Mulheres.

As sociedades regem-se por padrões de condutas, leis, direitos e deveres estabelecidos. Notadamente as manifestações de épocas remotas serviram para criar personagens polêmicos, tantos odiados quanto amados, dependendo da ótica de quem vivia os extremos da situação. É notório observar que as escolhas de caminhos percorridos podem ser vistas como trajetos positivos ou negativos, dependendo da visão de quem se posiciona fora do quadro acontecido. O Sertão nordestino tem sido palco de inesquecíveis posicionamentos de pessoas que de alguma forma mudaram suas trajetórias e envolveram vidas de outras pessoas, havendo dentre os fatos ocorridos um pré-julgamento de uma sociedade que muda seus pensamentos com o passar do tempo. A guerra de Canudos é a síntese de uma grande falha de pensamentos de uma sociedade equivocada e hoje se tenta justificar os meios utilizados, as formas de atuações e as várias análises do que na época chamou vitória de Heróis em referência às ações dramáticas realizadas pelo exército, ao martírio de um povo que almejava só provar que era possível uma vida longe dos impostos e dos deveres criados apenas para uma classe menos abastada, obedecendo ao líder Antonio Conselheiro. A esse fenômeno junte-se Pau - de - Colher, Pedro Batista, Beato Lourenço e o polêmico e adorado Padre Cícero Romão Batista.
O cangaço era particularmente, pela sua brutal forma de vida, um mundo exclusivamente machista. A mulher era figura descartada nesse meio. Os cangaceiros sempre que possível mantinham suas relações sexuais, aproveitando os bailes realizados nos coitos, sítios, fazendas, ou quando eram seviciadas e vítimas dos GERÁS (palavra usada na época para definir a prática do estupro).
A entrada das mulheres nos bandos foi visto por uns como sendo a desgraça e a decadência do cangaço. Para outros as mulheres vieram aplacar a fúria assassina e o desejo disforme que tanto feriram e humilharam as famílias nordestinas. Com a chegada e a permanência feminina, os cangaceiros adquiriram mais respeito para com as indefesas caboclas sertanejas.
Sebastião Pereira da Silva, o famoso Sinhô Pereira, único cangaceiro a chefiar Lampião, fez a seguinte declaração:
“Eu fiquei muito admirado quando soube que Lampião havia consentido que mulheres ingressassem no cangaço. Eu nunca permiti e nem permitiria. Afinal, o Padre Cícero tinha profetizado: Lampião será invencível enquanto não houver mulher no seu bando”.
O certo é que Lampião contrariou todas as expectativas e cedeu às armadilhas invisíveis do amor, lançando-se nos braços formosos e entregando-se aos beijos ardentes e sedutores da bela morena, da Malhada da Caiçara.
Foi em Paulo Afonso que Lampião encontrou sua grande paixão, Maria Gomes de Oliveira, a eternizada Maria Bonita. Foi ela a primeira mulher cangaceira e com ela abriu-se o precedente das companhias femininas, sendo Paulo Afonso, responsável por uma enorme leva de mulheres para o cangaço. Das mais famosas cangaceiras que saíram de Paulo Afonso, podemos citar as seguintes: Maria Bonita ( a Rainha do Cangaço), Lídia Pereira de Souza ( a mais bela das cangaceiras), Nenê (Nenê, de Luiz Pedro), Otília Maria de Jesus (Otília, de Mariano), Inácia Maria das Dores (Inacinha, de Gato), Catarina Maria da Conceição ( Catarina, de Nevoeiro) e a recém descoberta, Durvalina Gomes de Sá (Durvinha, de Virgínio e Moreno).
Com as mulheres vieram alguns contratempos, pois elas não tinham a valentia e a resistência dos homens e muitas vezes atrapalhavam quando ficavam doentes ou grávidas, tendo os cangaceiros que baterem em constantes retiradas, quando dos combates, para resguardarem a integridade física das companheiras.
Segundo relatos das próprias cangaceiras sobreviventes, a pior coisa era ter filhos e não poder criá-los. O amor de mãe era substituído pela dor ao ver seus frutos carnais serem postos em outros braços. Os filhos eram doados, geralmente a algum conhecido que tivesse condições para dar um mínimo de conforto à criança. Relato forte que temos nos dias atuais é o de Inácio Carvalho de Oliveira, Inacinho. Filho do casal de cangaceiros Moreno e Durvinha, que foi deixado com o cônego Frederico Araújo, religioso responsável pela igreja de Tacaratú, em Pernambuco.
Inacinho nasceu em plena caatinga, cercado pelo medo da aproximação das volantes policiais, parto realizado com recursos primordiais. Diante do risco dos tiroteios e do constante choro da criança que poderia ser rastreado, a alternativa para resguardá-lo foi a entrega ao Padre. Uma sábia e abençoada decisão.
Inacinho procurou durante anos por seus verdadeiros pais, nunca perdendo a esperança e sendo recompensado pelo reaparecimento do casal e do reencontro depois de setenta longos anos.
Outro caso célebre foi o caso Sílvio Bulhões, filho de Corisco e Dadá, entregue ao Padre Bulhões, em Santana do Ipanema, Alagoas.
Maria Bonita, também sofreu seus dissabores, quando do seu primeiro parto teve que se contentar com a dor ao ver seu primogênito ser um natimorto e ter que enterrá-lo no fundo do quintal do coiteiro que lhe deu guarida, o velho Venceslau, Seu Lau, fiel guardião dos trajetos do Rei do Cangaço, nas proximidades do povoado Campos Novos, em Paulo Afonso.
O que aparentemente seria uma ótima vida na visão das mulheres, que viam nos cangaceiros algo novo, uma aventura que poderia lhe trazer proveitos, acabava por mostrar o outro lado de uma vida sempre atribulada, de combates, fugas, mortes e desassossego. Arrastar as alpercatas sem ter pouso certo era tarefa penosa, muito mais para as mulheres que geralmente estavam sonhando com os príncipes que povoam seus sonhos de adolescentes. Na rebeldia de meninas-moças muitas deixaram o calor das moradias paternas para se lançarem nesse caminho sem volta. Muitas outras foram raptadas, relembrando o caso da cangaceira Dadá que foi raptada por Corisco, sendo estuprada e ficando sob a guarda de uma tia do cangaceiro. Dadá deixou um forte depoimento relatando que só o tempo curou os traumas do estupro e depois, com o passar do tempo, ela foi se apaixonando por Corisco e por ele nutriu o mais fiel sentimento de amor, até morrer.
Com Maria Bonita foi diferente ela já tinha sido casada quando conheceu Lampião e com ele resolveu seguir para o cangaço e a partir daí o cangaço nunca mais foi o mesmo, as mulheres trouxeram outra cara àquele mundo só de homens.
Sobre a Rainha do Cangaço muito se escreveu, alguns fatos comprovados e outros sem comprovações, sendo que em alguns momentos foram disseminadas pesquisas irresponsáveis de escritores que escreveram capítulos fantasiosos, que servem apenas para confundir a cabeça dos que buscam as reais informações sobre um tema tão debatido e pouco confrontado em suas bases orais. Em outros momentos os depoentes mentiram e enganaram os escritores e os leitores. O campo da pesquisa é complexo e é preciso tempo e discernimento para se aproximar das bases concretas, buscando os mínimos detalhes das falas dos depoentes, ouvindo o maior número possível de pessoas que viram ou viveram as cenas, na busca da aproximação com a veracidade.


PARA SABER MAIS:
1- A trajetória Guerreira de Maria Bonita, A Rainha do Cangaço, Autor: João de Sousa Lima.

2- Maria Bonita, Diferentes contextos que envolvem a vida da Rainha do Cangaço, Autor: João de Sousa Lima, Edson Barreto, Antonio Galdino, Rubinho Lima, Juracy Marques.

3- Contato: 75-8807-4138 ou joaoarquivo44@bol.com.br

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