sexta-feira, 15 de agosto de 2014

JOÃO DE SOUSA LIMA: NA VISÃO DE ARCHIMEDES MARQUES



    O ÊXIMIO RASTREADOR DOS SERTÕES


               Nos dias de hoje falar em pesquisa pertinente ao processo histórico que contribui significativamente com a configuração da cultura do Nordeste do Brasil, mais de perto, relacionada aos sertões, com destaque para o tema cangaço e não passar pelo crivo do historiador João de Sousa Lima – não desfazendo dos demais pesquisadores – é dispor de menor ensinamento, pois este homem é sem sombra de dúvida dos maiores Mestres da atualidade.

               À luz do incansável rastreador e investigador João de Sousa Lima efetiva-se um gostoso passeio pelos emblemáticos rincões do sertão, na perspectiva de resgatar histórias perdidas pelo tempo relacionadas às pessoas que efetivamente vivenciaram aquela época de sangue e pó. O descobridor de cangaceiros sobreviventes, coiteiros, volantes e adjacentes, o famoso “João das meninas” (apelido carinhoso em alusão ao amor que tinha às velhas cangaceiras, fruto das suas descobertas, com destaque para as saudosas Durvinha e Aristéia) nos dá aquela sensação de vivermos uma verdadeira lição de vida, pois sentimos no âmago que a partir de então tais pessoas passaram a fazer parte da sua vida, da sua família. O carinho e a dedicação que este pesquisador tinha para com Durvinha e Aristéia, e continua tendo ainda para com os seus familiares é algo que emociona o mais cético dos seres humanos.

               Mas não somente este historiador resgata e trás à tona pessoas até então desaparecidas, esquecidas ou perdidas no tempo, mas também melhor escarafuncha os costumes e façanhas desse sofrido povo de outrora que por falta de opção via na política oligárquica latifundiária uma inspiração de felicidade, bem como, na religião, no folclore, na valentia e na vingança, os fundamentos da honra e da moral. O sertanejo da época era antes de tudo um verdadeiro herói, pois vivia o terror da seca, as vontades dos “coronéis”, as atrocidades do cangaço e pior ainda, a violência oficializada das policias volantes, equivalente e por vezes até pior do que a empregada pelos bandoleiros. Coronéis, cangaceiros e volantes tinham o poder da vida e da morte, o poder da vida e da morte daquele povo que se confundia com o gado, “povo marcado, povo feliz” como bem diz o poeta Zé Ramalho na sua canção “Vida de Gado”.

               Todo bom nordestino sente que a “indústria da seca”, tem sido o modelo utilizado pelos políticos há décadas nos nossos sertões, cujos atos de corrupção tem como causa a incompetência, a leniência e o descaso de autoridades diversas, principalmente do governo federal, que diante dos desmandos e desvios de verbas públicas e ou a sua utilização para servir de moeda de troca eleitoral em prol de políticos inescrupulosos, tem ceifado vida de crianças, adultos, idosos  e animais, sendo a principal causa do êxodo rural, transformando os centros urbanos em verdadeiras favelas, pelo inchaço causado. Por vezes, por falta absoluta de opção, bravos sertanejos de outrora terminam entrando no mundo da criminalidade nos morros do tráfico dos grandes centros.

               Voltando ao tema central é visto a olhos nu que a contribuição histórica de João de Sousa Lima nos enche de orgulho. Orgulho de ver a cada semana no seu blog as suas novas descobertas, orgulho ver nos seus escritos, nos seus artigos, nos seus textos, nos seus livros todo relato que enfatiza, sobretudo, a vida do sertão, a luta do cangaço e o modus operandi das autoridades estatais no combate ao banditismo proporcionando instigantes racontos que, embora reais, se misturam com o folclore pluralista, típico da melhor imaginação do nosso sertanejo.

                     Misto de escritor, professor, pesquisador, estudioso, investigador, colecionador, cineasta, ator e também empreendedor, João de Sousa Lima, consegue transmitir nas suas escritas e nas suas descobertas o entusiasmo e o gênio que se fazem necessários a todo bom historiador, e o melhor, nada esconde do seu público.
               Detentor de grande capacidade criativa, interpretativa e de inteligência aguçada que alia teoria com operacionalidade, principalmente na área investigativa, João de Sousa Lima, também se imortaliza e nos dá de presente as suas diversas e importantes entrevistas com remanescentes do cangaço e afins.
               A contextura do incansável trabalho de João de Sousa Lima traz à baila discussões oportunas, pertinentes e necessárias, visto ser patente que intrinsecamente e simetricamente ele assenta nos pontos de apoio à verdadeira história, sem mentiras, invencionices ou extravagâncias. A busca da verdade pela verdade é o seu lema.
               Seguir investigando sertão adentro, nas terras áridas, principalmente na região do Raso da Catarina, no rastro das alpercatas de Virgulino Ferreira da Silva, o poderoso Lampião, nos caminhos espinhentos do sanguinário cangaceiro Gato, oriundo da tribo indígena Pankararé e de tantos outros cangaceiros que arrodearam as paragens de Paulo Afonso e adjacências é sem dúvida reviver um tempo de verdadeiros cabras-machos e isso o nosso rastreador do cangaço bem sabe ser e fazer com maestria.
               É patente, outrossim, no seu trabalho que João de Sousa Lima bem sabe enaltecer a forte mulher sertaneja que sem dúvida gerou uma grande referência em toda sociedade da época e deixou registrada sua passagem também nas veredas do cangaço. Todas elas tiveram grande importância no contexto histórico desse tempo. Concordo em número e grau com a opinião de que as mulheres cangaceiras vieram aplacar a fúria assassina e o desejo disforme dos seus companheiros que tanto feriram e humilharam as famílias nordestinas. Com a chegada e a permanência feminina no bando, os cangaceiros adquiriram mais respeito para com as indefesas caboclas sertanejas. Os estupros, antes presentes em quase todas as investidas criminosas, com a chegada das mulheres ao cangaço, praticamente deixaram de ocorrer.
               Nesse rito feminino aprendi com os seus ensinamentos que entre as mais famosas cangaceiras que saíram da região de Paulo Afonso, estão: Maria Gomes de Oliveira, a Maria Bonita, do povoado Malhada da Caiçara; Lídia Pereira de Souza, do Povoado Salgadinho (citada por todos os cangaceiros sobreviventes como sendo a mais bela de todas as cangaceiras. Assassinada covarde e brutalmente a pauladas pelo seu companheiro Zé Baiano em decorrência de uma traição amorosa); Nenê (a carinhosa Nenê, companheira de Luis Pedro), também do povoado Salgadinho; Otília Maria de Jesus (Otília, companheira de Mariano), do povoado Poços; Inácia Maria das Dores (Inacinha, companheira do feroz cangaceiro Gato, por sinal ambos índios da tribo Pankararé), do Brejo do Burgo; Catarina Maria da Conceição (Catarina, companheira do cangaceiro Nevoeiro, também um índia da tribo Pankararé), igualmente do Brejo do Burgo; Durvalina Gomes de Sá, (Durvinha, companheira apaixonada pelo cangaceiro Virgínio e após a morte deste, eterna mulher do cangaceiro Moreno), nascida no povoado Arrasta-Pé.
              É assim que vejo o trabalho e a trajetória do amigo João de Sousa Lima, um sertanejo de fibra, um pesquisador nato, um destacado escritor, um amante da nossa cultura que a despeito de todo bom e verdadeiro nordestino também cultua o fã clube do grande e imortal Luiz Gonzaga, o nosso símbolo maior, o ser que conseguiu sintetizar os anseios incontidos de um povo através da cadência que intercala os sons da sanfona, do triângulo e da zabumba expressando o mais refinado circuito musical então existente na nossa história.

              Privar da amizade de João de Sousa Lima é um privilégio que enriquece positivamente as relações de qualquer ser humano. João de Sousa Lima, além de tudo, sem dúvida alguma, é um cidadão possuidor de grandes virtudes, as quais se encontram indissociavelmente vinculadas ao código de honra de um povo forte, o povo sertanejo e nordestino que tanto nos orgulha.

Aracaju, 30 de setembro de 2013.
Archimedes Marques.
Delegado de polícia em Sergipe, pesquisador, escritor e colecionador do cangaço. Conselheiro do Cariri Cangaço















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