domingo, 14 de setembro de 2014

BOTIJAS, TESOUROS DO NORDESTE. - por João de Sousa Lima



BOTIJAS, TESOUROS DO NORDESTE.

 
As diversas histórias de Botijas transformaram-se em lendas, com seus relatos sempre acrescentados de uma pitada de aventura e do sobrenatural.
O Sertão Nordestino contém inúmeros relatos sobre as Botijas, tesouros enterrados em oitões de fazendas, nos batentes dos casebres, velhas árvores centenárias, entre pedras e lajedos.
Verdadeiros tesouros do passado, quando os sertanejos escondiam suas finanças e seus ouros em cabaças, potes de barro ou caixotes de madeiras e depois os enterravam em pontos estratégicos, tendo um alvo de referência de fácil acesso para o proprietário.
Dentre todos os pontos de relatos envolvendo esses tesouros escondidos, nenhum tem mais registros do que a imensidão do Raso da Catarina. Desde os relatos dos fugitivos da guerra de Canudos, passando pelos índios Pankararé, até chegar aos relatos deixados pelos cangaceiros, que além de ouro e moedas deixaram enterrados ou escondidos em troncos de árvores, munições e armas. A Cangaceira Dadá, de Corisco, Passarinho, Azulão, Gato, Inacinha, são alguns cangaceiros que deixaram materiais enterrados ou escondidos no Raso da Catarina. Muitos desses sendo encontrados por moradores da localidade. Dentre os fatos mais conhecidos podemos citar dona Marli Reis (sobrinha do famoso coronel Petronilio de Alcântara Reis), proprietária de uma pousada/restaurante em Chorrochó, Bahia. Ela sonhou com o fogo consumindo uma das paredes da igreja construída pelo Antonio Conselheiro, ao amanhecer se dirigiu pra igreja e quando tocou uma das paredes, exatamente a parede que ela sonhou em chamas, caiu um pedaço do reboco e de dentro da parede, junto com os escombros, caíram várias correntes e anéis de ouro, peças até hoje guardadas por ela como verdadeiro tesouro.
Um dos índios da tribo Pankararé, residente da reserva Brejo do Burgo, desmatava um terreno, nas proximidades da Baixa do Chico. Com um afiado machado começou a cortar uma velha árvore morta, entre os cortantes golpes da afiada lâmina, um tilintar, um barulho diferente do toque do machado com a madeira, a curiosidade aumentou, as machadadas ficaram mais rápidas, no oco da madeira uma velha ferragem de um mosquetão, arma usada pelos cangaceiros. Ferragem recolhida, árvore cortada, hora de colocar fogo no resto do tronco; Minutos depois do fogo ateado, tiros ecoaram e eles correram em busca de proteção entre pedras, muitos disparos, momentos angustiantes, vários minutos de espera até queimar o último projétil, várias balas deflagradas. Por falta de atenção a munição que estava também na árvore não foi avistada sendo consumida pelo fogo. Tempos depois a ferragem do mosquetão me foi presenteada.
Em Paulo Afonso, a estrada que dava acesso a Salvador, saindo de Santo Antonio da Glória, cruzava a nossa famosa Rua da Frente, nas proximidades da estrada, tempos depois, surgiu a cidade, entre o emaranhado de ruas, uma das vias de destaque: Rua do Coqueiro. Nessa rua, em outubro de 2010, o pedreiro Sabino começou um trabalho de reforma e ampliação de uma residência, traços marcados, linhas esticadas, ajudantes à postos, começam a escavação. Sabino maneja agilmente a ferramenta, buracos cruzam uma parte do quintal, entre golpes da picareta, um som diferente, Sabino observa uma velha cabaça partida por suas pancadas. A cabaça é cuidadosamente recolhida, dentro dela várias moedas de prata e cobre. Valores deixados no passado, relíquias colhidas no presente. Mais um tesouro desenterrado. Aproximadamente seis quilos e meio de moedas, tesouros da história, segredos encravados na terra, descobertas recentes, memórias de um passado ainda latente, registros de um tempo, datas marcadas: 1880, 1890, 1900, 1910, 1920, 1930, esfinges e gravuras de rostos famosos, Botijas, tesouros que atravessaram o tempo, nas escondidas fendas da terra, fatos registrados no presente, tesouros enigmáticos colhidos e que serão eternizados, parte da nossa história passada, reflexo de um tempo, memória de uma época, traços de uma geração, perpetuação de fatos, histórias e memórias de um povo e de uma cultura. O tempo em sua passagem registra atos, ações, fatos e emoções.

João de Sousa Lima
Membro da ALPA – Academia de Letras de Paulo Afonso.

Paulo Afonso, 13 de setembro de 2014

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